sábado, 6 de dezembro de 2008

Paris Rive Gauche: urbanismo sustentável

Paris Rive Gauche: urbanismo sustentável
Por Andressa Fernandes, para AU (Pini)

Polêmico por sua arquitetura, inteligente pela abordagem sustentável: assim é o projeto Paris Rive Gauche, na capital francesa, que une três bairros (os quartiers parisienses) de Austerlitz, Tolbiac e Masséna. E inclui edifícios como a Biblioteca Nacional, projeto de Dominique Perrault, e a Universidade de Paris 7. A região passa por debate e reformulações desde os anos de 1990, com projetos de repercussão que ultrapassam o perímetro das edificações e chega à urbanização e à consciência dos parisienses.

A revitalização de sua área de 130 hectares (1,3 km²) surgiu com o objetivo de ligar o antigo bairro ao Rio Sena, ao superar a declividade do terreno e remanejar 26 hectares (260 mil m²) cobertos por linhas férreas, que ficavam entre o bairro e o rio. A idéia também inclui o desenvolvimento de um novo pólo econômico da cidade, tornando a região atrativa para indústrias e para a geração de emprego, e ainda promover a miscigenação urbana e social. Para isso, propõe reequilibrar, por exemplo, a quantidade de moradias sociais e estudantis e integrar a universidade à cidade.

"Paris Revi Gauche era o último bairro que ainda podia receber novas obras", afirma Ana Rocha Melhado que, desde 2003, realiza uma pesquisa de pós-doutorado sobre a revitalização do local, pelo Departamento de Engenharia de Produção da Universidade de São Paulo, em parceria com a Université Pierre Mendés France (UPMF) e a Société d'Économie Mixte et d'Aménagement de la Ville de Paris (Semapa, a responsável pelo gerenciamento do projeto). As obras no Paris Revi Gauche ainda devem durar cerca de dez anos.

Sustentabilidade aplicada
Segundo Ana Rocha, no início do projeto a preocupação era mais social que sustentável. Aos poucos, itens como a redução no consumo de energia, gestão da água, redução da poluição sonora e melhoria de moradias e construções foram incorporadas e passaram a nortear o projeto, ao lado da necessidade de novos empregos, transporte e lazer.

Todos os prédios construídos nos últimos quatro anos passaram a utilizar eletricidade gerada a partir da energia solar captada por painéis fotovoltaicos, além de sistemas de reúso de água. Até 2025, o consumo energético da região deverá ser reduzido a ¼ do que era em 2000.

Com a certificação da Semapa pela norma ISO 14001, algumas exigências passaram a determinar projetos arquitetônicos: prédios teriam de ter cinco fachadas, espaços para convivência e jardim no térreo, além de um telhado verde. "A Universidade de Física e Química já foi totalmente pensada dentro desses critérios de gestão de resíduos e redução de impactos ambientais", afirma Ana. "Foi preciso que a luz natural entrasse por diversos ângulos da edificação, ao contrário do que acontece no modelo 'caixote' clássico, visto em construções mais antigas", diz.

A opção por meios de transporte menos poluentes também faz parte do conceito do Paris Revi Gauche: além do metrô, há o programa Velib, de aluguel de bicicletas em pontos estratégicos do bairro. "O conceito de sustentabilidade vai muito além das soluções técnicas de conforto acústico e energia; é preciso ter o transporte adequado", acredita a engenheira.

Arquitetura polêmica
As faculdades de Física, Química e Arquitetura já estão funcionando, junto das bibliotecas instaladas nos edifícios restaurados. Segundo Ana, a construção de edifícios residenciais no setor de Austerlitz deve começar em breve, enquanto as de Masséna e Tolbiac já estão prontas. Falta ainda agradar aos parisienses, que insistem na preferência pela arquitetura histórica.

Ana Rocha acredita que é possível trazer a idéia do Paris Revi Gauche para o Brasil, basta que as condições climáticas sejam revisadas. "Em São Paulo, esse conceito de urbanismo sustentável poderia ser utilizado na Operação Água Branca (criada em 1999, constitui-se de 13 obras que incluem a ampliação e alargamento de vias e abertura de novas ruas na região e viadutos sobre a linha férrea e o rio Tietê), mediante parceria entre capitais de investimento público e privado", afirma.

Ana acredita também que o Brasil está tecnicamente preparado para tal projeto. A maior barreira, pondera, será a cultural. "Envolve uma mudança de comportamento, associada à educação", diz. A pesquisadora ressalta que o investimento pesado em comunicação e conscientização da sociedade parisiense foi essencial para que o projeto desse certo. Essa também deverá ser condição básica para sua implantação e sobrevivência em um país como o Brasil.

O programa de Paris Rive Gauche:
- Investimento de 3 bilhões de euros entre 1991 e 2015;
- 26 hectares (260 mil m²) de linhas férreas cobertas;
- 20% da área para uso residencial (430 mil m²) com cinco mil unidades distribuídas entre unidades para estudantes, de interesse social e da iniciativa privada;
- 18% da área para serviços, como escolas (405 mil m²);
- 30% da área para bibliotecas e universidades (662 mil m² e 210 mil m², respectivamente);
- 32% da área para escritórios (700 mil m²), com capacidade para 60 mil funcionários;
- 10 hectares (98 mil m²) de área verde, com duas mil árvores.
Publicado originalmente em AU (Pini), em novembro 2008.

2 comentários:

RENATO RIGO disse...

Parabéns pelo Blog!
http://papodeobra.blogspot.com/

Antonio Macêdo Filho disse...

Caro Rigo,

Obrigado.
Parabéns também pelo seu.

Abraço.

Arq. Antonio Macêdo Filho